Um radiotelescópio com 40 metros de largura, atualmente em construção no nordeste do Brasil, terá a capacidade de detectar e localizar explosões misteriosas e luminosas de energia, mais brilhantes que galáxias inteiras, conforme revela um novo estudo da Universidade de Portsmouth publicado na revista Astronomy & Astrophysics. Estas explosões, conhecidas como rajadas rápidas de rádio (Fast Radio Bursts – FRBs), são intensos surtos de ondas de rádio descobertos pela primeira vez em 2007, representando os objetos mais luminosos em astrofísica. Embora mais de 800 FRBs já tenham sido detectados, a origem desses fenômenos permanece um mistério.
O Dr. Ricardo Landim, do Instituto de Cosmologia e Gravitação da universidade, é coautor de um artigo que explora as capacidades do telescópio radioastronômico BINGO na busca por FRBs. Ele afirma: “A origem dessas explosões é desconhecida desde a sua primeira descoberta. No entanto, sabemos que algumas delas ocorrem repetidamente, enquanto outras são eventos únicos. Esta pesquisa é empolgante porque previmos que o BINGO será capaz de observar FRBs e também determinar sua localização no céu. Localizar a posição exata nos ajudará a descobrir quão distantes no passado elas foram produzidas e nos aproximará da compreensão desse estranho fenômeno.”
As rajadas rápidas de rádio (FRBs, do inglês “Fast Radio Bursts”) são pulsos de rádio transitórios, descobertos em 2007 através de dados coletados pelo telescópio Parkes. A origem dessas rajadas ainda é um problema em aberto na comunidade científica. Elas se caracterizam por serem extremamente brilhantes e possuírem uma duração inferior a um segundo, além de um atraso no tempo de chegada que apresenta uma dependência frequencial bem conhecida. Até o momento desta redação, mais de 830 FRBs foram detectadas, das quais 206 são repetidoras (podendo ser periódicas ou não) e 19 galáxias hospedeiras foram localizadas, sem uma distribuição privilegiada aparente no céu. As detecções foram realizadas em frequências observacionais que variam de aproximadamente 110 MHz até cerca de 8 GHz. As ondas de rádio emitidas são dispersadas pelos elétrons livres no meio ao longo da linha de visada, e as medidas de dispersão (DM) geralmente elevadas, que excedem os limites da Via Láctea, sugeriram inicialmente que elas têm origem exclusivamente extragaláctica. No entanto, uma FRB também foi detectada na Via Láctea (Colaboração CHIME/FRB, 2020). Diversos objetos celestes estão sendo considerados como candidatos a progenitores das FRBs, incluindo núcleos galácticos ativos, restos de supernovas e fusões de objetos compactos, como estrelas de nêutrons, buracos negros e anãs brancas.
As FRBs têm sido utilizadas como ferramenta para diferentes estudos cosmológicos e astrofísicos para investigar temas como a fração de massa bariônica no meio intergaláctico; energia escura; o princípio da equivalência; o meio intergaláctico de fundo e halos; matéria escura; entre outros problemas astrofísicos. No entanto, os estudos baseados em FRBs ainda são limitados devido ao pequeno número de hospedeiros identificados, o que permite a determinação de seu deslocamento para o vermelho (redshift).
Diversos telescópios detectaram FRBs, como o Parkes, o telescópio de Arecibo, ASKAP, UTMOST, CHIME e Apertif, entre outros. O telescópio CHIME desempenhou um papel importante na descoberta de novas FRBs. Ele detectou 536 FRBs, observadas entre 400 MHz e 800 MHz, durante um ano, aumentando enormemente o número total de eventos conhecidos.
A tarefa de determinar o deslocamento para o vermelho da galáxia hospedeira ainda é desafiadora. De fato, para determinar a distância, deve-se localizar os eventos com precisão de segundos de arco. Outras pesquisas podem ser usadas para encontrar seus contrapartes ópticos. Localizar um evento FRB é muito importante para entender a origem e o ambiente de seu progenitor, bem como para usar sua determinação de deslocamento para o vermelho para abordar alguns problemas em aberto na cosmologia. Determinar a localização precisa dos eventos é possível usando técnicas interferométricas, onde os dados de diferentes antenas são cruzados para identificar a origem de uma emissão. Nosso objetivo é correlacionar os dados de um telescópio principal com dados de seus outriggers, que, neste contexto, são menores telescópios auxiliares de rádio.
O telescópio BINGO (Baryon Acoustic Oscillations from Integrated Neutral Gas Observations) é um instrumento de prato único com um refletor primário de 40 metros de diâmetro montado em uma configuração cruzada-Dragone, observando o céu na faixa de frequência de 980–1260 MHz em modo de trânsito. Durante a Fase 1 (que deve durar 5 anos), operará com 28 cornetas, cada uma acoplada a um pseudo-correlator equipado com quatro receptores. O design óptico deve fornecer uma resolução angular final de aproximadamente 40 minutos de arco. O telescópio BINGO está sendo construído na região nordeste do Brasil, e seu objetivo principal é observar a linha de 21 cm do hidrogênio atômico para medir as oscilações acústicas de bárions (BAO) usando a técnica de mapeamento de intensidade. Embora seja projetado para investigações cosmológicas, sua grande área de levantamento pode fornecer ciência ancilar em transientes de rádio.
O BINGO é um radiotelescópio projetado para realizar a detecção pioneira de Oscilações Acústicas de Bárions (Baryon Acoustic Oscillations – BAOs) por frequência de rádio e investigá-las por meio do elemento mais abundante no universo, o hidrogênio atômico. A construção do telescópio está em andamento e sua conclusão está prevista para o final deste ano.
O Dr. Landim e seus colegas testaram diversas configurações de outriggers, que são pequenos radiotelescópios projetados para ampliar significativamente a capacidade de busca do BINGO. Eles preveem que, utilizando esses outriggers em combinação com os instrumentos principais do BINGO, será possível localizar aproximadamente 23 FRBs anualmente, dentre as centenas que serão detectadas.
Dr. Landim complementou: “É um excelente resultado e estamos satisfeitos por poder prever o quão incrível será a ciência quando o BINGO estiver operacional daqui a um ano. Não há dúvida de que este novo e único radiotelescópio contribuirá significativamente para este campo de estudo que tem fascinado astrofísicos em todo o mundo.”
O BINGO, acrônimo para Oscilações Acústicas de Bárions a partir de Observações de Gás Neutro Integrado, é um projeto internacional com colaboradores no Brasil, China, Reino Unido, França, Itália, Espanha, Coreia do Sul, África do Sul, Alemanha e Estados Unidos.